A INICIAÇÃO no candomblé

A INICIAÇÃO no candomblé>> Não há nada mais difícil, desafiador e ao mesmo revelador do que a a iniciação no Candomblé.

O processo iniciático começa com uma lenta regressão.

A pouco e pouco, vamos nos desligando da vida profana exterior ao Barracão e mergulhando no ambiente do Terreiro.

Nessa imersão, somos gradativamente limpos de todas as energias negativas, das vaidades, das individualidades; e vamos sendo apresentados a uma nova sociedade: a Comunidade de Axé.

Essa sociedade tem regras e rotinas próprias.

E para bem entendermos essa dinâmica ímpar, aprendemos logo de início os pilares básicos: obediência aos mais velhos, humildade e solidariedade.

A INICIAÇÃO no candomblé reaprendemos tudo

Na iniciação, reaprendemos tudo. Reiniciamos a vida. Renascemos para o Orixá e com o Orixá.

Inicialmente nos parece incômodo e sem sentido só falarmos quando nos é dada licença; não olharmos nos olhos dos nossos interlocutores; sermos privados das mais íntimas e básicas escolhas.

Mas essas são profundas e sábias instruções.

São indicativos de que devemos aprender a “sentir”, antes mesmo de aprendermos a “agir”.

É dessa sensibilidade, é dessa dedicação que o Orixá precisa para se manifestar em nós de forma plena.

A INICIAÇÃO no candomblé – Esse período de regressão e imersão é único

Nunca em toda a nossa existência, teremos 21 dias de retiro para pensarmos exclusivamente em nossa vida.
Repensarmos nossos atos, reprojetarmos nossas estratégias de vida, desenvolvermos nossa relação com as divindades.

Neste período, conhecemos suas histórias, regências, energias, rezas, cânticos, toques, danças, mistérios e tabus.

Na iniciação, nos deparamos com as mais fortes manifestações de energia de nossa existência, até então.

Morremos e nascemos, pedindo licença e bênçãos a todos os Orixás.

Redirecionamos nossos odus (destinos), sedimentamos nosso vínculo definitivo com o divino.

Ao contrário do que pensam, esse chamado vínculo definitivo nada tem de prisão.

<h4A INICIAÇÃO no candomblé – Na natureza não há prisão, há liberdade

Pelo contrário! Os Orixás são forças da natureza e na natureza não há prisão, há liberdade!

Liberdade de sentir, de perceber, de reconhecer, de intuir, de realizar.

A prisão só existe na consciência pesada de cada um.

Muitos homens viveram presos em celas, atados a grilhões de ferro, mas eram livres em sua fé, em seus pensamentos.

Após todos os procedimentos litúrgicos, quando o Orixá dá seu nome diante da Comunidade, ali inicia a festa de nascimento de mais um adepto.

Ali festeja-se a preservação e o crescimento da tradição trazida do outro lado do Atlântico, embutida no peito dos escravos.

Naquele momento renasce e renova-se a esperança, a vida e a fé.

Depois desse evento, como bebês recém-saídos do útero de Oxum, vamos então lentamente sendo reconduzidos à vida, experimentando novamente o retorno aos hábitos do cotidiano.

A INICIAÇÃO no candomblé- um renascimento

Vamos valorizando a liberdade em cada gesto, em cada pequena permissão que nos é concedida.

Deveríamos falar mais sobre a iniciação.

Acho importante que o iniciado valorize cada minuto dessa experiência tão especial.

É importante que ele se prepare não somente para os ritos, mas para o fenômeno de renascer.

Para a rara oportunidade de reescrever a sua história.

Desejo que os abiãns não queiram se iniciar pela mera vaidade de serem “adoxados”.

Desejo que o exercício de humildade aprendido, seja praticado também do lado de fora do roncó.

Desejo que os irmãos se preocupem mais em orientar do que em punir.

Desejo que tenhamos sempre força para não nos afastarmos dos nossos propósitos, e acima de tudo, que não nos esqueçamos nunca de que o Candomblé é uma Religião.

Não é uma seita, nem um conjunto de rituais que visam apenas sortilégios e magias, sem regras, sem moral e sem ética.

A INICIAÇÃO no candomblé e seu sentido

Por isso o sentido da iniciação: para que o homem velho morra em vida, cedendo espaço para que o homem novo reconduza sua existência em harmonia com os deuses, com sua consciência e com a natureza.

Que o Grande Arquiteto do Universo nos ilumine e ampare em nossa jornada.

Márcio de Jagun

crédito de imagem destacada http://yledosorixas.blogspot.com/2012/08/candomble-de-ketu-nago.html




Outros artigos interessantes deste mesmo autor:

Deixe seu like e siga nossa Rede Social:
0

Marcio Righetti

Márcio de Jagun, Babalorixá, professor de cultura e idioma ioruba na Uerj e na Uff, escritor e advogado. tel.: 99851-6304 (cel/wz) e-mail: ori@ori.net.br Facebook: Márcio de Jagun blog.ori.net.br

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *