A Medicina Ioruba

A Medicina Ioruba

A medicina ioruba se vale de três tipos de substâncias curativas:

tanto as amargas (korò), quanto as ácidas (ta) e as picantes (kon).

Tais substâncias são classificadas dentro das três cores primordiais:

o branco (funfun), o vermelho (pupa) e o preto (dúdú). Sobretudo, seguindo a mesma categoria dos três tipos de sangue encontrados na natureza.

As substâncias curativas funfun são:

Os ossos, manteigas vegetais, metais e pedras brancas.

As pupa são:

dendê, mel, cascas, sementes e metais amarelo avermelhados.

Conquanto, as dúdú são:

pós obtidos através de ervas, ou ossos torrados, seiva de plantas e carvão mineral.

Há ainda três tipos distintos de aplicações das substâncias curativas:

a inalação, a ingestão, ou a aplicação.

Mas na arte da cura, o corpo surge como protagonista.

É o corpo que recepciona a doença, assim como é ele o próprio veículo de cura.

Por mais que as substâncias sejam utilizadas em suas peculiaridades; por mais que os procedimentos sejam realizados, é o corpo que efetivamente deverá reagir.

No corpo será instaurado o processo de cura. A cabeça deverá “entender a doença” e o restante do organismo deverá “convidar a doença a se retirar”.

Contudo, sempre antes da prescrição, é necessária a consulta ao Oráculo, a fim de verificar qual o tipo de enfermidade (se espiritual/emocional, ou física), como curá-la e quais os ingredientes necessários.

Grande parte das vezes a doença manifestada no corpo, é apenas uma consequência de emoções.

Afecções cutâneas por alergias, precisam ser investigadas para que a real causa (por vezes emocionalmente oculta) seja identificada e sanada.

Na quantidade da composição dos ingredientes de cura, observamos um meticuloso método que relaciona elementos e números.

A expressão “numerologia” acaba nos levando a uma compreensão descontextualizada. Por isso, prefiro criar o neologismo “ifalogia”, para explicar este princípio.

A ifalogia seria a ciência pela qual o ioruba se baseia em princípios filosóficos de Ifá, para reconhecer nos números energias e potencialidades. A imparidade, a paridade o àṣẹ dos odù, e a compatibilidade entre eles e os àwọn òrìṣà (orixás), pode ser entendido como “ifalogia”.

Logo, com base na ifalogia, o ioruba, seguindo à orientação oracular, irá conciliar o número de elementos/princípios ativos para compor o remédio. Assim, observaremos que a quantidade de ervas para o banho, para o chá, ou o número de elementos utilizados para os ẹbọ, seguirá esta lógica.

A medicina pode ser preventiva.

Neste caso, novamente através do Oráculo, o consulente saberá quais devem ser seus impedimentos (èèwọ̀) a serem respeitados para evitar desequilíbrios energéticos e materiais.

Os èèwọ̀ podem determinar o que não deve ser comido, feito, ou vestido.

O cumprimento dos èèwọ̀, além do caráter disciplinar, também pode ser determinante para se evitar que tanto a doença, quanto o desequilíbrio e os perigos se instalem na vida do indivíduo.

Nos seus métodos curativos, os iorubas consideravam as folhas (ewé), frutas (èso), flores (òdòdó), sementes (kóró), cascas (ìyangbẹ), talos (kùkùté) e raízes (ẹkàn), de onde extraíam os princípios ativos necessários.

Para o melhor aproveitamento dos efeitos curativos e energéticos, as plantas eram colhidas quando ainda molhadas pelo orvalho e deixadas para secar à sombra, pois acreditavam que a ação do sol retirava parte do poder das ervas.

As raízes seguiam o mesmo método. Contudo, eram bem lavadas e picadas em pequenos pedaços, antes de serem postas para secar.

Após a secagem geral, dispensavam as partes machucadas, ou estragadas. Separavam para uso, apenas as mais viçosas e perfeitas.

As folhas, os talos, as raízes e as flores, que não fossem utilizadas de imediato, eram conservadas em atọ́ (cabaças destinadas para este fim) mantidas em locais secos e protegidas do sol.

Quando acumulavam umidade, eram postas novamente para secar à sombra. Caso acumulassem mofo, eram descartadas em definitivo, pois já não serviriam para as finalidades herbológicas.

Seus preparados (de ingestão, ou aplicação), consistiam em unguentos (ìpara), pastas (àkunra), sumos (omi èsokéso), saladas (ẹ̀fọ́), papas (ẹ̀bà), emplastros (egbògi), óleos (epo), tinturas (àwọ̀ ewé), xaropes (oyin tegbògi) para gargarejos (yọnu), inalações (gbin), banhos (ìwẹ̀ ewé), compressas (tẹ̀yà), pós (atin), ou chás (àsèmu).

Podemos observar que muitas das técnicas descritas abaixo, são ainda hoje utilizadas na cultura tradicional jêje-nagô, assim como nos tratamentos medicamentosos ocidentais (porém, com outras denominações).

(trecho do livro Ewé, a Chave do Portal – JAGUN, Márcio. RJ: Litteris, 2019)
Márcio de Jagun
Professor, escritor e babalorixá.
ori@ori.net.br

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Marcio Righetti

Márcio de Jagun, Babalorixá, professor de cultura e idioma ioruba na Uerj e na Uff, escritor e advogado. tel.: 99851-6304 (cel/wz) e-mail: ori@ori.net.br Facebook: Márcio de Jagun blog.ori.net.br

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