Em Busca da Cura
Em Busca da Cura
“O médico está sempre enredado emocionalmente com a pessoa (ou pessoas) que estiver atendendo.
O grau de ignorância dessa situação emocional determinará a qualidade da condução dos procedimentos clínicos.”
Roudinesco et Plon
De que modo a descrição do processo de cura nos tratamentos no templo de Epidauro por Esculápio, o médico divino, poderia nos ajudar a compreender o que transparece do mesmo processo nos dias de hoje?
Quais os elementos da relação médico-paciente que conduzem, facilitam ou promovem a cura?
Esculápio aprendeu de Chíron, a conhecer os poderes medicinais das ervas existentes no vale em que habitava, especialmente as virtudes da erva chamada “chirônio”, que curava mordidas de cobras.
Dizia-se que era capaz de curar até o ferimento provocado pela flechada envenenada que Chíron recebera de Hércules.
Em Busca da Cura de uma ferida incurável
O detalhe trágico é que a ferida de Chíron era incurável. Não deveria nunca fechar. O paradoxo de que aquele que está sempre curando permanece eternamente doente ou ferido, parece estar no centro do mistério da cura.
Na verdade, o princípio subjacente deste mistério é simplesmente o conhecimento de que uma ferida é também experimentada, e de modo permanente, por aquele que cura.
Duas questões essenciais emergem desta reflexão: a primeira, por que o médico tem de ter o conhecimento (consciência) de sua própria ferida?
Por que necessita experimentá-la, de vivenciá-la a fim de efetuar a cura?
Isto teria alguma relação com o conhecimento e a participação nas feridas do paciente (diagnóstico e terapia)?
O segundo ponto trata do mito de Esculápio refletido nos dias de hoje na relação médico-paciente como um aspecto arquetípico da transferência, no mito muito bem descrito durante o processo de cura através da intercessão do médico nos sonhos de seus pacientes.
Em Busca da Cura e a parceria entre o médico interior e o exterior
O doente procura um médico ou doutor externo, mas o fator intra-psíquico, ou “fator curador”, ou ainda o “médico interior” é também mobilizado.
Mesmo o médico, externo sendo muito competente, as feridas e doenças não poderão ser curadas se não houver a ação do “médico interior”.
O que sugere que não somente o paciente tem um médico dentro de si mesmo, mas também que existe um paciente no interior do médico.
A expectativa de que a pessoa do médico, agindo externamente, mesmo com a ajuda de toda tecnologia possa ser capaz de efetuar a cura, tanto quanto, ou no lugar, do “médico interior”, é um grande erro.
A verdadeira cura só pode acontecer quando o paciente entra em contato com o seu “médico interior” e dele recebe ajuda.
A esperança ilegítima do médico é conseguir manter a doença nos limites do paciente, de modo que não venha a tocar a sua pessoa.
Essa atitude colabora para que jamais se enxergue o lado sombrio ferido de si mesmo, ou a periferia das próprias limitações de cada um.
John Donne, pregador e o maior representante dos poetas metafísicos da época medieval (1572-1631), nos alertaria:
“Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é
arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou parte do gênero humano. E POR ISSO NÃO PERGUNTES POR QUEM OS SINOS DOBRAM; ELES DOBRAM POR TI”.
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