Essa Mulher, Mara Régia

Essa Mulher, Mara Régia

Conhecemos Mara Régia em minha casa, mais precisamente, embaixo de um frondoso jambeiro em meu jardim.

Ela me foi apresentada por uma amiga em comum, Helenice Carvalho, no mesmo dia em que outras amigas, inclusive a equipe do Meio do Céu teve o prazer de conhecê-la.

Ela havia fugido um pouco de Brasília, cidade onde mora, e para nosso deleite veio ter conosco no mesmo dia de seu retorno.

Foram horas que se passaram rápidas quando nos deliciávamos com suas histórias das mulheres da Amazônia, as quebradoras de coco. Emocionava-nos com o tom de sua voz, com a vivacidade de seus gestos, o brilho de seus olhos e o amor que esparramava por cada uma daquelas mulheres que viviam uma existência tão diversa da nossa em pleno Rio de Janeiro.

Naquele momento, uma certeza interior tomou posse de mim: de que enquanto existirem pessoas tão comprometidas e apaixonadas pelo crescimento do outro, ainda poderíamos ter esperanças.

Ela me injetou a dose de esperança que precisava naquele momento de introspecção e balanço de minha caminhada por militância nos movimentos da vida, e que naquele momento, tinha a mais absoluta certeza, em sua maioria, não deram em nada.

Mara Régia adocicou minha boca amarga com o sabor da frustração gerada pela morte de muitos ideais.

Fato difícil de assimilar para quem já havia se entregado tanto por amor e fé num país e num mundo melhor.

Naquele instante fui capaz de acreditar que ainda dá para fazer muito, e a velha chama reacendeu em mim.

Estou certa de que em cada uma de nós que compartilhávamos aquele espaço sagrado, cuja testemunha era a nossa Yggdrasil doméstica, o velho jambeiro.

Mara, nosso carinho e muito obrigado por ainda acreditar e seguir….

Claudia Araujo

Sinopse sobre o Programa Natureza Viva
Programa Natureza Viva

Rádio Naccional da Amazônia– Ondas Curtas

Frequências de 11.780 kHz ( faixa de 25m); 6.180 kHz (faixa de 49m). De 2a à 6a feira, das 7h30às 8h.

Natureza Viva é um programa que navega os rios da Amazônia através das ondas do rádio. Ele foi criado em 1993 em parceria com o WWF e outras instituições para o desenvolvimento sustentável dos recursos naturais da Amazônia .

Voltado para uma região onde telefone é luxo , correio é irregular e até o IBGE, por absoluta falta de acesso, não consegue chegar com sua Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, Natureza Viva é hoje o principal canal de comunicação das lideranças rurais da Amazônia.

É também um eficiente instrumento de disseminação de práticas ambientalmente corretas.

Em recente pesquisa de campo realizada pelo Departamento de comunicação da UNIMEP, em São Paulo , com 90 lideranças rurais e 450 pequenos proprietários e trabalhadores rurais, 76,7% dos ouvintes entrevistados afirmaram já Ter adotado ao menos um conceito ou informação disseminada pelo programa.

Mas Natureza Viva é também Natureza Mulher porque se propõem a tratar do impacto do meio ambiente no corpo feminino.

E é assim que essa geografia vem sendo mapeada com o apoio da Fundação MacArthur que, desde 97 apoia o Projeto Mulher nas Ondas do Rádio : Corpo e alma rompem o silêncio.

O objetivo é sistematizar o perfil dessa audiência e potencializar a capacidade educativa do rádio na superação dos obstáculos que bloqueiam a sexualidade e comprometem a saúde reprodutiva das mulheres da floresta.

Natureza Viva é ainda Natureza criança na defesa dos direitos da infância e adolescência, quando dá vida à personagem Maria Bela que, semanalmente, entra no ar para construir com os meninos e meninas da Amazônia Legal , nosso destino comum , o futuro , a Agenda 21.

Apresentação :

1- Tem um trabalho pioneiro no trato das questões de gênero através do rádio.

2- Começou nos anos 70 na Rádio Nacional de Brasília e colocou os microfones do programa VIVA MARIA a serviço da mobilização das mulheres na busca de seus direitos .

3- A partir de 1989 começa a desenvolver cursos de capacitação para o uso do rádio e a produzir uma série de programas temáticos sobre infância, adolescência, saúde e direitos reprodutivos , ecologia etc.

4- Desde 1993 tem sua comunicação voltada para as mulheres da floresta através da Rádio Nacional da Amazônia.

No Natureza Viva o eixo principal é meio ambiente. No Natureza Mulher o destaque maior é dado a questão da saúde da mulher e direitos reprodutivos.

5- Em 97 , como bolsista da Fundação .MacArthur, começa a pesquisar a sexualidade das mulheres amazônicas com o projeto: MULHER NAS ONDAS DO RÁDIO. Corpo e alma rompem o silêncio .

Mídia, Mulher, Maritaca

Mara Régia

“Depois que minha voz começou a correr mundo pela Amazônia através do rádio, o povo aqui do Vale do Anari passou a me respeitar muito mais! Até meu marido tá falando mais baixo…”. (Dirce de Oliveira, Vale do Anari, Rondônia)

Esta citação é de uma das cartas que recebo de participantes de um projeto de capacitação para o uso do rádio na Amazônia, que acabou revelando lideranças, mas, essencialmente, sendo um canal para a emancipação de mulheres por meio da comunicação. Mesmo que muitas delas não usem o termo midia ou sequer saibam o seu significado conceitual, produzem avaliações e expressam sentimentos que definem o poder da midia, talvez com uma precisão dificilmente alcançável, mesmo por teóricos e especialistas.

Dirce é uma “Repórter Maritaca”, nome que criamos para definir quem se dedica a coletar e difundir informações – com meios rudimentares, no máximo com pequenos gravadores – de interesse das comunidades, numa realidade tão difícil de lidar, onde às vezes transmitir uma informação significa enfrentar horas de barco de um lugarejo a outro. Ela vem-se firmando como uma das lideranças rurais mais respeitadas na reserva extrativista onde mora. Acaba de conquistar, inclusive, um novo espaço político: foi eleita representante da Secretaria da Mulher na Organização dos Seringueiros de Rondônia.

Assim como Dirce, Nilda (de Óbidos, Pará), Lilineth (de Silves, Amazonas), Teresa Bordalo (de Oiapoque, Amapá) e tantas outras revelam-se grandes comunicadoras, não importa se de um serviço de alto-falante ou de um orelhão, entrando em rede nacional, via satélite, para todo o Brasil. São castanheiras, seringueiras, pescadoras, parteiras, quebradeiras de côco como dona Raimunda Gomes da Silva, a feminista do sertão, que tem o dom da palavra e a espontaneidade que são as capacidades raras e tão procuradas pela midia.

Dona Raimunda, com um poder na voz que impressiona, discute a questão de gênero, que pronuncia como se falasse inglês: “É gender e liderança”, é macho e fêmea, discussão sobre menino-homem e menina-mulher. E enquanto tenta achar soluções para as tantas dúvidas levantadas pelas amigas da Associação de Mulheres do Bico do Papagaio, no Tocantins, vai cantando: “Ei não derruba essas palmeira, ei não devora os palmeirais, tu já sabe que num pode derribar, precisamos preservar as riquezas naturais…”

Lá e cá, mulheres e mídia.

Seringais da Amazônia, grandes centros urbanos. E as mulheres descobrindo e se apossando da comunicação como um veículo prioritário de vida e libertação.

Como mostram os dados recentíssimos do Instituto Ayrton Senna, sobre os trabalhos inscritos para o seu Grande Prêmio de Jornalismo: 65% são de mulheres.

No asfalto, na floresta, mulheres “maritacas” vão à luta pelo poder de informar e marcar as diferenças, o que no fundo, é uma aceitação e um elogio dessas diferenças.

Mara Régia, jornalista, radialista e bolsista da Fundação MacArthur, desenvolve projetos de capacitação em rádio para comunidades na Amazônia

artigo de 1998




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material originário do antigo site Meio do Céu - Claudia Araujo, hoje denominado Grupo Meio do Céu - Claudia Araujo e composto por diversos novos colunistas. Essa é uma maneira de preservar o material do antigo site, assim como homenagear aqueles que não mais escrevem no site e/ou não mais estão entre nós nesse plano da existência. Claudia Araujo

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