Netuno e a Solutio na Obra de Kielowski – Bleu III

Netuno e a Solutio na Obra de Kielowski – Bleu III

Netuno e a Solutio na Obra de Kielowski, mas também Lua e Saturno na Coagulatio.

A realidade é que as operações alquímicas não possuem uma ordem rígida na Alquimia. Elas são vividas ao longo de nossas vidas.

De fato, o alquimista tinha como pressuposto o termo ¨Solve e Coagula¨ . Netuno nesse contexto, se insere como um solvente. Ele dissolve o ego, abrindo espaço, geralmente, para que outras operações ocorram.

A prima-matéria precisa voltar ao seu estado natural, indiferenciado, para que brote vida nova. É similar ao retorno ao útero materno com finalidade de renascimento.

Muitas são as imagens associadas a esse processo, tais como a água, o nevoeiro, o dilúvio, o aguaceiro, e dentre várias outras, o batismo, que idubitavelmente aponta para uma vida nova. Uma nova identidade.

A personagem Julie vivia num estado de solutio permanente em seu casamento com Patrice. Além de não mais reconhecer a si mesma como identidade separada do marido, também não se enxergava em sua integralidade.

Após sua saída do hospital e da perda do marido e da filha, percebe que aquele capítulo de sua vida precisa de alguma maneira ser extirpado para que possa seguir em frente. E toma decisões nesse sentido.

Volta à casa aonde moravam para se desfazer dela, e especialmente, pede aos empregados que antes de sua ida esvaziem o quarto azul, o quarto de sua filha.

Entretanto, mesmo esvaziado, sobra o lustre de cristal azul que decide levar consigo.

Abre mão de todos os objetos da casa, e mesmo dela, mas não sem antes destruir os vestígios de sua vida familiar. Aquela que lhe prendia ao passado.

Olivier, que também trabalhava junto a seu marido, entra em cena, e sequestra as fotos que lhe poderiam colocar os pés na realidade. Ele a amava e ela sabia disso.

Num primeiro momento, também inconsciente, faz isso no sentido de protegê-la, mas isso também se transforma como veremos em outras partes do filme.

Há que se ressaltar o fato de que ela até então, não abriu espaço para seu necessário luto. Julie não chora, e é Marie, a empregada, que chora porque ela não chora.

Os papéis se invertem e é Julie a consolar Marie, como se a sua dor fosse materializada via Marie.

Ela começa a encerrar essa fase de sua vida quando ao conversar com o advogado.

Fala da venda de tudo e o dinheiro indo para uma conta que não é a sua. Só pede a promessa de que ampararia tanto o jardineiro quanto Marie, além de garantir a vida confortável de sua mãe no asilo até seu último momento de vida.

O próprio advogado lhe pergunta: e vc? ela lhe diz que ficará apenas com sua conta particular.

Julie começa a tentar se libertar do passado, mas como comentei em artigo anterior, ele não lhe deixa. E não lhe deixa por uma razão muito simples: ela era o centro desse passado embora ainda não aceitasse o fato.

Existe a fuga da realidade em várias cenas do filme. A mãe da Julie, a Julie que construiu internamente um mundo perfeito que ela acaba concluindo nem tão perfeito era, e o próprio Olivier, que durante anos dá os créditos de grande músico ao marido dela. Ambos são engolfados pela forte personalidade do Patrice.

Também sua mãe que internada num asilo e provavelmente com alzheimer, nunca lhe reconhece embaralhando sua vida com a de sua tia, irmã de sua mãe.

Frágeis são os apoios na realidade até então.

Ao sair da casa, Julie vai destruir os laços que ainda lhe prendem ao período e visita a moça que cuida das partituras da famosa música que levou Patrice a tamanho reconhecimento: A canção para celebrar a unificação européia.

A moça lhe entrega a partitura mas guarda uma cópia sem que Julie saiba. Ainda comenta de que haviam muitas correções que Julie havia feito. Ela contesta que não mais do que o usual.

Acreditando ser a única cópia, atira no lixo para que seja destruída.

É chegada a hora de lidar com a perda da filha. Busca em sua bolsa um pirulito que ainda restava igual ao que a filha chupava quando morreu.

Nesse momento o processo é inverso ao daquele referente à música de seu marido. É aí que entra a outra operação,a coagulatio. A coagulatio costuma ser seguida por outros processos, em geral pela mortificatio e pela putrefactio.

Experimenta-se a coagulatio como sujeição porque ela confina a  pessoa à sua realidade verdadeira, aquilo que o destino lhe reservou.

Fixatio é um dos sinônimos de coagulatio.

Julie engole sofregamente o pirulito da filha.

O ato de comer tem significado de incorporá-lo literalmente, torná-lo corpo. Nesse momento, ela e a filha tornam-se uma apenas. Ela é incorporada à Julie.

Nos próximos artigos poderemos observar os desdobramentos desses temas. Até lá.

Parte I http://www.grupomeiodoceu.com/internas/2019/07/02/netuno-e-a-solutio-na-obra-de-kielowski-bleu-i/

Parte II  http://www.grupomeiodoceu.com/internas/2019/07/04/netuno-e-a-solutio-na-obra-de-kielowski/

O filme no youtube  https://www.youtube.com/watch?v=hJ4Zx77XTNM&fbclid=IwAR39ArMXr96fbALoGIgsrnHD-MWrxmHI2in-m3F6tDyBZg_QOF-mYYRnsNE


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Claudia Araujo

Aquário com Gêmeos, sou muitas e uma só. Por amar criar com as mãos, sou designer de biojóias e mantenho o site terrabrasillis.com, assim como pinto aquarelas e outras ¨manualidades¨. Por não me entender sem a busca do mundo interno do outro, sou astróloga com 4 anos e meio de formação em psicologia analítica sob a supervisão de José Raimundo Gomes no CBPJ – ISER e já mantive por anos o site Meio do Céu. Nessa nova etapa mantenho o site grupomeiodoceu.com. Dou consultas astrológicas e promovo grupos de estudo de Jung e Astrologia, presenciais e online. São várias vidas vividas numa única existência, mas minha verdadeira história começa aos 36 anos, e o que vivi antes ou minha formação acadêmica anterior, já nem lembro, foi de outra Claudia que se encerrou em 1988. Só sei que uso cotidianamente aquilo em que me tornei, e busco sempre não passar de raspão pelo mapa astrológico do outro. Mergulhar é preciso, e ajudar o outro a se transformar, algo imprescindível. Só o verdadeiro autoconhecimento pode gerar transformação. Não existe mágica, e essa autotransformação não ocorre via profissional, mas apenas através do real interesse do cliente em buscar reconhecer como se manifesta em sua vida cotidiana e qual seu potencial para a transformação. Todos somos mais do que aquilo que vivenciamos. A busca deve passar sempre pelo reconhecimento daquele eu desconhecido que em nós mesmos habita. A Astrologia é um facilitador nessa busca porque nela estão contidos tanto nossos aspectos luz quanto sombra. Ela resolve nossos problemas? A resposta é não. Ela apenas orienta no sentido do reconhecimento de nossa totalidade. A busca é do cliente. A leitura é do astrólogo, mas só o cliente poderá encontrar o caminho de sua totalidade e crescimento responsável. websites : www.terrabrasillis.com e www.grupomeiodoceu.com Fale com Claudia direto no Whatsapp

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