Umbanda – Uma banda que toca a liberdade

Umbanda – Uma banda que toca a liberdade>> Quando era mais jovem e estava sendo consagrado sacerdote eu esperava ansiosamente pelo dia em que um profeta aparecesse e feito Maomé ou Moisés no Islamismo e Judaísmo, escrevesse uma doutrina de Umbanda coesa, não-contraditória, sistemática, metódica, que servisse de padrão para uniformizar o trabalho de todos os terreiros.

Era um sonho para nós pensar em uma Umbanda cujas vozes soassem todas no mesmo tom, cantando as mesmas notas. Nós acreditávamos em uma Umbanda tradicional, fundamentada em raízes ancestrais.

O tempo foi passando e quanto mais estudava, mais o sonho parecia distante. Vasculhando as tradições, todas foram inventadas. Mas valia a ideia de um reformador.

Porém, todos que tentaram sistematizar a religião de acordo com seu próprio ponto de vista deram margem à ideia de serem os detentores da ‘verdadeira Umbanda’, deslegitimando ou diminuindo o trabalho daqueles que pensavam distintamente.

Cada um pretendia ser o avatar de uma nova era no movimento umbandista e no fim das contas, a promoção pessoal e os interesses financeiros emergiam das entrelinhas de seus discursos.

Umbanda – Uma banda que toca a liberdade- uma religião sem profetas

Não tivemos um ‘profeta da Umbanda’ que contribuísse com a religião sem converter sua ‘caridade’ em cursos pagos e caros, taxas de iniciação, venda de guias (colares rituais) e outros apetrechos, canais em redes sociais que mais servem à promoção pessoal que à própria Umbanda.

Sob uma falsa humildade todos diziam no fim das contas ‘eu sou o melhor’. E ao mesmo tempo, aquele terreiro simples, que era usado pelos caboclos e pretos velhos para atender todas as pessoas sem distinção e que realizava verdadeiros milagres contados de boca a ouvido pelos anciãos da religião foi desaparecendo.

Um amigo me disse que precisávamos tirar a Umbanda do fundo do quintal e transformá-la em uma grande religião, como se grandes religiões fossem medidas pelo sucesso financeiro e pela suntuosidade de seus templos e sacerdotes. Citou as igrejas neopentecostais como exemplo.

Falou de forma elogiosa sobre os pastores que usam programação neurolinguística para arrebanhar fieis. O tempo passou e tudo isso inverteu as minhas expectativas. Torço de fato para que ninguém seja reconhecido como ‘o maior nome da Umbanda’ e para que cada terreiro tenha sua liberdade e autonomia.

Umbanda – Uma banda que toca a liberdade e o perigo de um modelo único

Percebo hoje os perigos da imposição de um modelo único a ser seguido e do culto às personalidades dos escritores e pop stars. O futuro parece sombrio mas a certeza é que a força da religiosidade popular que aqueceu e amalgamou as diversas matrizes formadoras do povo brasileiro para fazer nascer a Umbanda é maior que a tentativa ininterrupta de transformá-la em um produto fácil, pronto para ser usado. Usando a expressão do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, esses ‘tempos liquidos’ que tudo desagregam, fragilizando relações e valores, passam sobre a Umbanda feito chuva ácida.

A certeza que tenho é que aquela velhinha que tem um quartinho no fundo do quintal onde ela, com um terço na mão, recebe sua preta-velha e benze as crianças da vizinhança, jamais desaparecerá porque é nela que a sabedoria do tempo encontra um canal de manifestação no planeta.

Não há lógica do mercado que destrua a Alma do Mundo, que é eterna e já foi tudo, já viu tudo, estava aqui quando nada existia e continuará aqui quando todo o resto deixar de existir.




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Baba Fábio

Baba Fábio de Xangô é o dirigente espiritual da Tenda São João Batista, terreiro de Umbanda Tradicional localizado no bairro da Penha, SP. Seu caminho na Umbanda vem desde a infância. Criado em uma família umbandista, também percorreu outros caminhos, estudou Cabalá com um mestre judeu de Safed, Israel, radicado na Suíça. Também estudou astrologia, tarô e hermetismo. Em sua vida acadêmica graduou-se em moda e estudou filosofia na Universidade Federal do ABC. Baba Fábio lançará em 2018 seu primeiro livro, 'O Oráculo dos Orixás', um livro sobre os orixás na Umbanda ricamente ilustrado pela artista carioca Orádia Porciúncula, pela editora Presságio.

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