Lute como um garoto reserva!
Lute como um garoto reserva!>> Permitam-me contar uma breve história nesse momento em que os resultados das pesquisas eleitorais de segundo turno são desanimadores para todos os que desejam um Brasil democrático e soberano.
Vocês já ouviram falar em “garbage time”?
Essa é uma expressão usada no basquete para definir o tempo de jogo restante quando o placar é definitivo e ambos os técnicos colocam os seus jogadores reservas na quadra.
Eu joguei basquete como federado por nove anos, a maioria deles no clube Monte Líbano de São Paulo, uma referência absoluta do esporte no Brasil nos anos mil novecentos e noventa.
Minha equipe era forte; nesses anos todos disputamos sempre os títulos paulista e brasileiro com chances efetivas de sermos os campeões.
Porém nem isso livra um time de eventuais derrotas acachapantes.
E hoje quero escrever exatamente sobre uma tarde onde apanhávamos feio de nosso arquirrival, o Sírio Libanês.
Nos primeiros três minutos do terceiro quarto (as partidas já eram divididas em quatro tempos de dez minutos cada) a vantagem do Sírio beirava os quarenta pontos.
Como ainda não havia o arremesso de três pontos – sim, eu sou velho – o placar era vergonhosamente definitivo.
Nosso técnico pediu um tempo e sacou todos nossos titulares. O técnico do Sírio fez o mesmo
Porém nossos reservas estavam com fome de bola e com vontade de mostrar serviço; paulatinamente a diferença foi caindo e caindo.
O técnico do Sírio que de bobo nada tinha, parava o jogo sempre que podia e até voltou com seus titulares para a quadra.
Nosso técnico não; manteve os reservas no jogo.
O que foi mudando com o passar dos minutos foi sua postura – de resignada para esperançosa e de esperançosa para empolgada a cada cesta de seus suplentes.
Nem com seus titulares o Sírio conseguiu tomar novamente as rédeas da partida.
Nossos reservas entraram em um nível de empolgação contagiante e erravam muito pouco, cada vez menos, até que, insolitamente, o cenário era de uma vantagem de apenas quatro pontos para o Sírio com ainda um par de minutos por jogar!
Perdemos, mas por apenas dois pontos de diferença
Me lembro de ter chorado muito no vestiário naquele dia; o que poderia ser pior para um garoto competitivo como eu do que retomar as esperanças em uma partida perdida para então perdê-la de verdade?
Era uma sensação de derrota dupla!
Hoje, passados trinta e cinco anos daquela distante tarde de sábado, entendo a lição de forma diferente: sempre vale a pena lutar.
Não lutamos tão somente por resultados, mas também por causas.
Se não pela vitória, para marcarmos território, para mostrarmos ao adversário que estamos vivos e que morreremos combatendo, ainda que vencer pareça um sonho distante.
Ser de esquerda hoje é como ser um daqueles bravos garotos reservas na referida tarde: é lutar sem nunca dirigir o olhar desanimado para o placar.
É brigar ferozmente por tudo o que acreditamos – porque nossos ideais não mudarão com o resultado de eleição alguma.
E então, vamos entregar o jogo e o país para os fascistas ou lutar por tudo aquilo em que acreditamos?
Porque vença quem vencer, seguiremos até a morte na briga por um mundo melhor!
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