O Hino da Pérola II – Raul Branco
O Hino da Pérola II – Raul Branco
I – A descida para o plano material:
O nobre filho parte do Oriente, da terra da luz, acompanhado de dois guias. Esses, são provavelmente aqueles seres divinos chamados de Arcanjos, Elohim ou Sefirotes. Cuja missão é facilitar a descida da emanação das Mônadas dos planos da plenitude celestial até o corpo físico.
Segue-se um relato da passagem do jovem por diferentes lugares. A denominação desses locais deve corresponder à realidade histórico-geográfica da época em que o hino foi escrito. E vela o seu significado interno.
Atravessar as fronteiras de Maishan significa a passagem da alma pelos limites do mundo celestial. Ou a ponte entre o mundo espiritual e o material, chamada no oriente de anthakarana. E ainda na Cabala referida como a sephira Tiphereth.
É nesta esfera que os seres de luz se ‘misturam’ com os seres materiais. O lugar de encontro dos mercadores orientais. Esse local, ou melhor dito, plano de consciência, parece simbolizar o ponto de transição entre a mente superior e a inferior.
Decerto é nele onde os conceitos abstratos são cambiados por conceitos concretos utilizados neste mundo. Chegam, então, à Terra de Babel, que tradicionalmente expressa a confusão dos sons. Ou seja, das vibrações do plano dos desejos, das emoções e das paixões.
II – O labirinto da vida se forma:
Outrossim, entram pelas muralhas de Sarbug, também referida como o Labirinto. Simbolizando os inextricáveis meandros da Providência, que determina o destino dos homens.
É provavelmente uma alusão ao plano etérico em que uma complexa rede de ligações energéticas determina a conformação e as tendências dos corpos humanos.
Ao chegarem ao Egito, símbolo do corpo físico, seus acompanhantes, tendo cumprido sua missão, retornam a seu mundo de origem.
Nosso aventureiro estabelece-se numa hospedaria, ou seja, no corpo físico em que veio ao mundo. Para os gnósticos, o corpo humano era considerado como uma hospedaria da alma, expressando a ideia da impermanência.
Ele parece um estranho aos seus companheiros. Pois, enquanto o peregrino estiver consciente de sua missão divina, apesar de estar vestido como os egípcios (encarnado), será de alguma forma diferente dos outros. Na medida em que seu comportamento e suas motivações estarão pautados por interesses que não são deste mundo.
III – A centelha divina em cada um:
O viajante, porém, alia-se a um ‘homem livre, filho de nobres da terra da Alvorada’. Esse, ‘jovem formoso e bem favorecido,’ representa o guia, ou instrutor espiritual. Ele sempre aparece quando o peregrino está em busca do supremo tesouro.
E sua orientação e ajuda são inestimáveis para que o buscador possa realizar sua missão.
O nobre amigo do nosso herói aconselha-o a não se misturar com os impuros. Os egípcios, porém, com suas artimanhas, apresentam-se ao viajante e oferecem-lhe seus alimentos.
IV – As tentações do mundo material:
No caso, mais do que alimentos físicos, trata-se de alimentos para as emoções e as paixões, para o orgulho e a ambição, que mantêm a mente constantemente direcionada para atividades ligadas às coisas deste mundo.
Com isso, o filho do Rei esquece-se de sua missão e torna-se súdito do rei local, ou seja, passa a atender aos interesses materiais, mergulhando num profundo esquecimento das coisas espirituais.
Seus Pais percebiam tudo o que se passava e ficaram ansiosos. A ansiedade dos Pais é um véu. Pois sabiam desde o início a natureza difícil da missão de seu filho e o longo tempo que deveria durar.
V – Providência dos céus no momento exato:
Porém, chegado o momento apropriado na longa jornada da alma. Que só a providência divina conhece. A corte divina envia uma mensagem em que cada membro da hierarquia celeste assina seu nome. Assinar o nome significa colocar seus poderes à disposição do destinatário.
A carta lembra uma referência similar existente no livro Voz do Silêncio. Onde é dito que o guia é a voz interior, a expressão da consciência divina. Que só pode ser percebido quando há total silêncio interior. E, portanto, quando o indivíduo não mais está voltado para as coisas do mundo.
A carta voa como uma águia e, ao pousar ao lado do destinatário, transforma-se num discurso. A águia, a ave mais poderosa que voa em direção ao sol (o Logos). E desce para tomar pequenos quadrúpedes como presa (a personalidade quaternária). Inegavelmente simboliza a natureza divina no homem que é enviada como mensageiro ao peregrino na terra distante.
VI – Elevando a consciência:
A águia representa o Cristo interior. A intuição espiritual, que ao pousar traz a verdade espiritual para o plano da mente concreta. Esse é um lindo simbolismo para a mensagem enviada pelo Pai e a corte celestial. Que, na realidade, já se encontra no interior da alma, no âmago do ser.
O vôo representa a elevação de consciência que permite a percepção do mundo sutil além dos interesses mundanos.
A graça divina permite que o atribulado aventureiro possa ouvir a voz do silêncio. A mensagem da carta, e assim ele se levanta, despertando de seu sono profundo.
O buscador regozija-se com a dádiva recebida. A lembrança de sua verdadeira natureza, e agradece a seus Pais, beijando a carta. Ou seja, absorvendo a mensagem de seu Eu Superior à sua consciência usual. O beijo é usado com freqüência na linguagem sagrada para expressar a união.
Nesse caso a união da consciência superior (a mensagem do plano intuitivo simbolizado pela águia). Com a consciência inferior (o jovem peregrino). O viajante percebe, então, que a carta já estava escrita em seu coração desde o princípio.
Ela é a mensagem da Vida Una, que reverbera nos planos sutis desde o princípio da manifestação.
Essa idéia é também expressa por Paulo.
“Nossa carta sois vós, carta escrita em nossos corações, reconhecida e lida por todos os homens. Evidentemente, pois, uma carta de Cristo, entregue ao nosso ministério, escrita não com tinta, mas com o Espírito de Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, nos corações!” (II Cor 3, 2-3)
Ao receber a mensagem da carta, o buscador desperta e parte para cumprir sua missão. A estória não dá maiores detalhes sobre como é obtido o tesouro. Além da informação de que o jovem começou ‘a cativar a serpente, encantando-a para dormir, cantando para ela o nome de seu Pai’. Está implícito o poder dos nomes sagrados da divindade, usados na Cabala como mantras.
O peregrino invoca o nome do Pai, da Mãe e de toda a hierarquia celestial. Mobilizando toda a força divina dos Arcanjos para despertar e utilizar os tremendos poderes da serpente adormecida.
A kundalini, elevando-a até a cabeça onde ocorre a iluminação libertadora, a gnosis, simbolizada pela pérola. Esse processo tem um estreito paralelo com a Cabala, em que a consciência é elevada pelo pilar central. Usando a força armazenada na base, na sephira Yesod, valendo-se então da intermediação do redentor Tipheret, para finalmente alcançar a sephira oculta. Daath, que significa Conhecimento, ou seja, gnosis.
VII – A libertação do espírito:
Uma vez obtida a pérola preciosa, o peregrino está livre do Egito e parte em direção à casa do Pai. Deixando para trás as vestimentas impuras. Isso parece indicar que, tendo obtido a iluminação, o buscador liberta-se do mundo da matéria. E, simbolicamente, descarta seus corpos grosseiros.
Caso deseje mais tarde voltar numa missão de misericórdia. Para ajudar outros buscadores adormecidos no Egito. Este poderá adquirir veículos, ou vestimentas, apropriados para esse tipo especial de missão. Que, apesar de serem idênticos aos usados pelos moradores da terra, não são sujos nem impuros. Pois foram especialmente confeccionados para o nobre, agora um Mestre de Compaixão e Sabedoria.
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