Nizan

Nizan

ESSE É MEU NOME

Por que negros foram excluídos do ensino nos períodos imperial e republicano?

Para quem nutre a imagem algo romântica dos negros forros, de pé no chão e sem rumo, Nizan Pereira Almeida oferece em sua pesquisa alguns fatos até então condenados aos rodapés dos livros de História.

Nizan: Vim da classe média. E sou alto. Me tomavam por um atleta.

O médico patologista Nizan Pereira, de mais 65 anos, professor da Universidade Federal do Paraná e ex-secretário de estado, doutor em Educação pela PUCPR, discorre sobre a naturalidade com que a exclusão racial passou a ser encarada no Brasil, desde os tempos do Império.

Também fala de cultura e futebol, reflexo do “estado das coisas”. Confira trechos da entrevista dada à Gazeta do Povo.

Nizan por ele mesmo

“Nunca tive dificuldade por ser negro. Não me sentia diferente. Sempre fui respeitado. Vim da classe média. Meu pai era ferroviário. E eu tinha essa altura (risos). Me tomavam por um atleta. Minha mãe, minha irmã e eu pudemos alugar uma casa no Juvevê, sem problemas, quando aqui chegamos em 1967.”

“Eu era estudante de Medicina e gostava de andar pelos corredores da universidade. Me detive nos quadros de formatura. Desde os anos 1950, havia apenas três negros, nenhuma mulher. Professor negro na faculdade de Medicina tive um, o Lafayette. Na minha turma de 1967, só havia uma pessoa negra, ou que se assumia negra, eu.”

“Tive poucas situações de enfrentamento de racismo.

Sutilmente devo ter sido alvo. Lembro de estar discutindo na universidade e um cara disse ‘pô, Black is Black’. Era como chamavam – eu não sabia. Podiam me chamar de Tigre, de Gorilão, eu tinha alguns apelidos.

Os alunos me chamavam de Lothar, o valete do Mandrake. Não iam me chamar de Leonardo Di Caprio, né. Isso nunca me incomodou.”

À primeira vista, parece mero exercício de dispersão “sou um pouco exibido”, brinca o homenzarrão de 1,95 metro, legítimo “tímido espalhafatoso” , não fosse Nizan, sobretudo, um atleta.

Na juventude, jogava basquete.

Na maturidade, faz ginástica para responder a uma pergunta tão simples quanto embaraçosa: por que os negros não foram incluídos no sistema de ensino brasileiro por ocasião do 13 de maio de 1888?

O assunto é sua obsessão por boas décadas talvez desde o dia em que se percebeu o único negro nas escolas onde andou.

Nutriu-a no exercício de sua vida pública, à frente das secretarias da Saúde ou na pasta de Assuntos Estratégicos no último governo Requião.

Juntou material o bastante. Nos últimos anos, decidiu, como se diz, “sistematizar” tanta conversa numa tese de doutorado, defendida em fevereiro de 2014 no programa de Educação da Universidade Católica do Paraná.

O título é longo, como de praxe aos espartilhos acadêmicos:

A construção da invisibilidade e da exclusão da população negra nas práticas e políticas educacionais no Brasil.

Tem orientação do sociólogo Lindomar Wessler Bonetti. E promete trazer sabor a uma discussão fadada a voos rasantes.

Para levá-la mais a fundo, Nizan fez uso de um conceito de efeito inigualável “a naturalização”.

Não tem mistério. Pode ser entendido por uma criança de 12 anos:

a população negra ficou à margem porque o país achou que ficar de fora, para esse grupo, era o normal. Eis o ponto.

Num trabalho estafante mas traduzido de forma palatável o “cestinha” Nizan Pereira tira proveito do método dos chamados “livros de interesse geral”.

Leva o leitor nas águas mornas falando-lhe de gregos, romanos e seus escravos “coisificados”, verdadeiras mercadorias.

Depois, oferece águas escaldantes.

Se para defender a tese o pesquisador tinha uma pergunta, ao terminá-la deixa dezenas de outras. Impossível não se questionar, por exemplo, por que, por tanto tempo, os professores não se incomodaram com a ausência de alunos negros nas fileiras. Teria faltado mérito a tanta gente?

Um dos feitos mais notáveis da pesquisa de Pereira está em não se render ao “vitimismo”.

Ao responder por que a exclusão dos negros passou a ser vista como algo natural, recorre ao estigma racial, como não poderia deixar de fazer, mas também ao cipoal da economia brasileira da virada do século 20.

A colocação dos negros à margem se tornou uma estratégia de escala industrial. Era preciso não reconhecê-los, o que incluía não lhes garantir a escola, e o pior, com o respaldo da lei, na contramão da universalidade do ensino público, então em curso na Europa.

Para quem nutre a imagem algo romântica dos negros forros, de pé no chão e sem rumo a exemplo do que fazem acreditar os retratos de Marc Ferrez Nizan oferece alguns fatos até então condenados aos rodapés dos livros de História.

Lembra as revoltas negras do século 18 dos Búzios, dos Alfaiates, das Argolinhas , e que os negros desempenhavam ofícios das mais diversas naturezas, logo, participavam da sociedade, uma sociedade que lhes negou o passaporte à vida organizada.

A dedução é instantânea os escravos e ex-escravos não foram privados apenas da escola, mas também do mundo do trabalho.

Privilégio que passa a ser reservado aos imigrantes. Os negros eram muitos para serem pagos, como mandava a nova ordem do capitalismo mundial.

A solução foi estender a eles o olhar reservado aos índios, pouco elogiosos, usando do etnocentrismo e da ciência para justificar a exclusão.

De tão repetidas, essas máximas viraram verdade na cabeça de muitos brasileiros e na estrutura do país.

“Quando o próprio negro começa a repetir o que se diz sobre ele, ah, é quando se chega à perfeição”, pontua o pesquisador, sobre a vitória do sistema de exclusão:

virou algo natural até para quem devia combatê-la. Doutor Nizan explica.

Um afro abraço.
Claudia Vitalino.
Pesquisadora-Historiadora – ativista do movimento negro
Fonte: Origem: Wikipédia



Outros artigos interessantes deste mesmo autor:

Deixe seu like e siga nossa Rede Social:
0

Claudia vitalino

UNEGRO-União de Negras e Negros Pela Igualdade -Pesquisadora-historiadora CEVENB RJ- Comissão estadual da Verdade da Escravidão Negra do Estado do Rio de Janeiro Comissão Estadual Pequena Africa. Email: claudiamzvittalino@hotmail.com / vitalinoclaudia59@gmail.com

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *