BIOCONSTRUÇÃO: UMA ARQUITETURA FEITA A MUITAS MÃOS

BIOCONSTRUÇÃO: UMA ARQUITETURA FEITA A MUITAS MÃOS

TELHADO VIVO E PAREDES VERDES — Práticas ecológicas

O uso de telhados verdes e de jardins verticais nas grandes cidades traz diversos benefícios ao meio ambiente urbano. O telhado vivo é excelente isolante térmico, absorve água das chuvas e purifica o ar. Além de bonito, ele traz a natureza de volta, assim como reduz a temperatura da cidade e o consumo de energia com ar condicionado, por exemplo.

Por isso mesmo, diversos países adotam políticas públicas pioneiras de fomento à sua adoção. No Brasil, por exemplo, o PL Nº 7162/2010, do Deputado Federal Jorge Tadeu Mudalen, propõe desconto de 5% no IPTU para aqueles que implantarem telhados verdes (em 50% da área de cobertura), em cidades com mais de 500 mil pessoas.

Para o professor Gernot Minke , paredes de adobe (barro cru) e telhados verdes mantêm constantes a umidade do ar e a temperatura interna de um edifício, independentemente do clima de fora, favorecendo trocas equilibradas com o ambiente.

Estudos indicam que o telhado verde drena até 30% das águas pluviais e reduz a temperatura interna da construção em até 5,3ºC.

Em versões mais leves custa aproximadamente R$100,00/m2. Mas pode custar mais do que o dobro disso, dependendo da técnica de impermeabilização adotada.

A durabilidade e a eficiência da técnica dependem precisamente dessa impermeabilização eficiente.

Entre as possibilidades, a menos ecológica é a manta asfáltica, aplicada sobre compensado de madeira. Esse material também o é mais vulnerável à perfuração de raízes, além de ser um produto caro , por isso é o menos recomendável.

Fundado nos anos 70 por Johan van Lengen e por sua companheira, Rose van Lengen, o Instituto de Tecnologias Intuitivas e Bioarquitetura – TIBÁ é um centro educacional de ecologia aplicada e arquitetura de baixo impacto, que hoje oferece consultorias e aulas de Saneamento Ecológico, Bioconstrução (Bambu, Barro, Teto Verde) e Planejamento de Ecovilas, além de cursos de alimentação não convencional, produção orgânica e sistemas agroflorestais (PANCs, SAFs e outros).

Em janeiro de 2019, participei do curso Telhado Vivo e Paredes Verdes, junto com cerca de vinte e cinco alunos, vindos de diversas regiões do Brasil . Relato aqui a experiência.

Aprendizagem teórica e prática:

Na parte teórica do curso, Marc van Lengen — filho de Rose e Johan, coordenador do TIBÁ e professor de Bioarquitetura, Telhado Vivo e Paredes Verdes — mostra diversos exemplos do uso de telhados vivos e jardins verticais realizados no mundo. Destaca os princípios da impermeabilização que utiliza e cita os materiais disponíveis no mercado. Em seguida nos guia pelas práticas, começando com as paredes e os pilares verdes. Termina com uma demonstração de montagem de telhado vivo num modelo (caixote) e um passeio pelo instituto, onde encontramos diversos telhados verdes executados.

1. construção de parede verde
2. construção de pilar
3. aula sobre teto verde, em maquete e em construções de TIBÁ

Jardins Verticais:

As paredes e pilares verdes foram construídos utilizando recipientes de Bidim® (manta geotêxtil para drenagem): bolsas de 30x30cm e “minhocas” de 23cm de diâmetro por mais de 2m de comprimento.

O manuseio dessa “linguiça”, em especial, exige a participação de, no mínimo, seis pessoas de cada vez. Na bioconstrução, parece que andorinha sozinha não faz verão. O trabalho artesanal é uma sinfonia tocada a muitas mãos!

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Execução de parede verde em treliça de metal (Foto @turyna, 2019)
Tetos Verdes:

Segundo Marc, a melhor impermeabilização é a recomendada pelo alemão Gernot Minke. Consiste em um sanduíche de manta geotêxtil (Bidim®), lona de estufa e mais um geotêxtil, colocado acima da madeira do forro e logo abaixo do substrato de terra do telhado (15cm). Essa lona é mais resistente às raízes.

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– Bioconstrução e telhado verde em TIBÁ (Foto @turyna, 2019

Existe ainda uma geomembrana de PVC, que já vem com a manta geotêxtil colada em baixo. Neste caso, deve-se colocar o geotêxtil em cima, apenas. Entretanto, Marc destaca que esse material é menos maleável, não sendo recomendado para locais onde haja curvas.

As Raízes Descalças: Johan e Rose no TIBÁ, Bom Jardim

Durante o almoço vegetariano, os alunos se encontram, conversam e novas redes se formam. O cardápio original é um sucesso, desenvolvido por Aga Probala, esposa de Marc.

As obras de Rose e os desenhos do arquiteto estão expostas para visitação, juntamente com os desenhos originais do arquiteto fundador. Com sorte, você tem a honra de encontrar Johan no almoço do último dia. Uma conversa agradável, cheia de casos e acasos.

E se você possui um exemplar do Manual do Arquiteto Descalço, tem chance de ganhar uma longa e pessoal dedicatória do autor – marca registrada de Johan. Ouvir dele mesmo suas histórias, de Rose e do TIBÁ é uma oportunidade inesquecível. Uma dádiva!

 

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Johan van Lengen, fundador do TIBÁ, autografando seu Manual do Arquiteto Descalço (Foto @Turyna, 2019)

Ele parece saber disso, pois vai nos encantando com um sorriso no rosto, suas histórias de amor, de vida e de bioconstrução. Quando ele e Rose chegaram a Bom Jardim, o terreno que encontraram estava completamente devastado pelo pastoreio. Os dois sonharam o TIBÁ juntos: “o lugar onde as pessoas se encontram!”. Ele destaca que: “foi Rose quem reflorestou tudo isso”. Toda essa beleza!

Ela, lançando sementes em terra boa… e florescem! Ele, experimentando sempre algum novo material e forma de construir ecologicamente, em parceria com outros especialistas da bioconstrução, como os alemães Gernot Minke — barro, telhados verdes — e Georg Stam — treliças e estruturas em bambu —, que ainda hoje dão aulas no instituto. Para Johan, sorte deles foi terem sempre encontrado parceiros de muita qualidade .

Sistemas ecossanitários e um sanitário seco (Bason) foram desenvolvidos por Johan, no TIBÁ. Seu desenho orgânico e inovador considera especialmente o clima, os materiais locais e um novo modo de viver, ecológico.

Para nossa sorte, nesse sítio, tudo nasce e floresce.

Hoje, Johan dá aulas e palestras. Seu filho Marc e a nora Aga administram o Instituto e os cursos de bioconstrução, saneamento ecológico, PANCs… Formada em moda, Aga também oferece aulas de tecelagem.

Atelier de tecelagem em tricô de Aga Probala, administradora do TIBÁ (Foto @Turyna, 2019)
Atelier de tecelagem em tricô de Aga Probala, administradora do TIBÁ (Foto @Turyna, 2019)
Atividades oferecidas no TIBÁ, em Bom Jardim

A cada mês há um curso, com hospedagem e alimentação vegetariana .

Os cursos mais tradicionais acontecem anualmente: Bambu — George Stam; Bioconstrução com Terra e Telhado Vivo — Gernot Minke; Bioconstrução — Marc Van Lengen. Há ainda cursos de Planejamento de Ecovilas e de uso de PANCs. Além disso, Aga também oferece um aperfeiçoamento de tecelagem em tricô, raro e interessante.

Próximos cursos serão anunciados no site: www.tibario.com

Além dos cursos oferecidos, os interessados podem se inscrever também na modalidade Aprendiz e aprofundar a experiência no Instituto TIBÁ, por um período mais prolongado — de 1 a 3 meses. Todos parecem satisfeitos com a experiência de aprendizagem.

O professor de biologia marinha da UFF, Bernardo Gama, é vizinho de chácara e frequenta os cursos do TIBÁ. Participou do curso de janeiro e pretende aplicar técnicas de bioconstrução em seu refúgio na serra.

“No curso de telhado verde e jardins verticais, aprendi com o Marc van Lengen, de forma leve, simples e na prática, a não somente fazer telhados verdes, como também transformar paredes e colunas em belas pinturas vivas. Além de o TIBÁ ser um lugar incrível, verdadeiro museu de bioarquitetura a céu aberto, a convivência e troca de experiências são inesquecíveis e têm efeitos duradouros nas vidas dos alunos. As refeições são uma experiência à parte: Aga, a maga dos temperos, surpreende os paladares mais refinados com suas combinações surpreendentes de especiarias frescas e moídas na hora. Viva o TIBÁ!” (Bernardo Gama, Professor de Biologia Marinha).

João está se formando em arquitetura pela Santa Úrsula, RJ, e achou o curso ótimo!

“Além de terapêutica, a experiência foi extremamente eficiente, por causa da prática que tivemos ao montar o jardim vertical.” (João, arquiteto arquiteto recém-formado).

Outros alunos são ligados a empresas de arquitetura, de paisagismo ambiental e a organizações não governamentais. Miguel Vida, arquiteto, trabalha em ONGs. Pretende aplicar o aprendizado em construções nas comunidades. Gaby e Melissa, sócias na empresa de paisagismo VerdePerto, estão aprimorando a técnica de jardim vertical, ramo em que já atuam. Fernanda trabalha num escritório de arquitetura em São Paulo e sente grande resistência dos clientes quando sugere o uso de telhados vivos e outros sistemas ecológicos.

Essa tendência vem mudando lentamente. Nos países onde o meio ambiente é prioridade, as leis ambientais vêm ganhando espaço.

Esperamos que o Brasil siga essa tendência e que as políticas públicas abram espaço para que o verde ocupe novos espaços na cidade: em forma de jardins e hortas verticais, bem como coberturas verdes.

“Verde, que te quero ver-te!” Ver de perto!

Revisão: Regina Cerqueira de Carvalho (recerq@gmail.com

http://www.confea.org.br/media/Palestra_SOEA_TelhadoVerde_MarcioRios_310816.pdf, acesso em 01/03/2019.
Professor e bioconstrutor alemão, autor de diversas publicações sobre o tema. Manual de construção com Terra: uma arquitetura sustentável, 1ª ed., São Paulo: B4, 2015.
Sistema semi-hidropônico, criado por empresa de Porto Alegre, com reservatório de água em colmeias de PVC e reaproveitamento de EVA.
Impermeabilização com manta asfáltica 4mm, estimada em R$ 50,00/m2 no DF (01/03/2019).
Das 12 e 13, jan.2019, em Bom Jardim.
Informações sobre Tibá, http://www.tibario.com
Entrevista de Johan van Lengen, concedida em 31/07/2018, www.feiradasustentabilidade.com.br
Entrevista de Marc van Lengen, concedida para o Canal da Bela, em 14/06/2017, https://youtu.be/x-0YKqkwxKA
Próximos cursos anunciados:
7-10.Março/2019. Bambu, com Jaime Peña.
15-21.Abril/2019. Beta&Alfa e Arquitetura Orgânica, com Johan van Lengen e Irina Biletska.
11-12.Maio/2019. Jardim Vertical e Teto Verde, com Marc van Lengen.




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Turyna Adriana

A autora é jornalista (PUC/Rio, 2016), arquiteta e Mestre em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília (Brasília, 1987 e 2007). É apaixonada por Arquitetura Bioclimática, Bioconstrução, Permacultura, e Projetos de Economia Solidária e de Inclusão Social. Atua especialmente em projetos que priorizam a reciclagem e a reutilização de vidro, a construção com reaproveitamento de materiais recicláveis, a sustentabilidade, a redução do desperdício, a cooperação e a inclusão social. Desde 2002, em seu Atelier Verde Garrafa, a arquiteta candanga desenvolve e produz blocos vitrais pré-moldados e azulejos de vidro, reutilizando garrafas de vidro descartadas no Distrito Federal. Vive no Rio de Janeiro, onde desenvolve projetos autorais de fotografia, de animação (stop motion) e de publicação. Revisitando regularmente, a prática da escrita e da ilustração. A coluna REINVENTO trará matérias sobre experiências de ecoeficiência na construção – tais como a reutilização de materiais recicláveis e naturais, reaproveitamento de água da chuva, produção de energia limpa, paisagismo produtivo, tratamento ecológico de resíduos, arquitetura bioclimática, entre outras práticas sócio-ambientalmente sustentáveis. TURYNA (Adriana) / Skype reinventoturyna@gmail.com

2 comentários em “BIOCONSTRUÇÃO: UMA ARQUITETURA FEITA A MUITAS MÃOS

  • março 26, 2019 em 5:43 pm
    Permalink

    Eccelente matéria sobre o instituto Tibá! Fiquei muito interessada em conhecer de perto.

    Resposta
    • maio 23, 2019 em 11:53 am
      Permalink

      É muito interessante, Elce. O forte deles a bioconstrucao com terra, bambu e práticas ecológicas de construção.

      Resposta

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