SINCRETISMO A PADROEIRA DO BRASIL: A MÃE NEGRA DO BRASIL RACISTA!

SINCRETISMO A PADROEIRA DO BRASIL

Alguns pensam o sincretismo como um resultado, produto híbrido de uma mistura de elementos tanto culturais quanto religiosos.

Outros, contudo, o veem não como resultado. Outrossim, como processo dinâmico de reinterpretação destes mesmos elementos que geram o hibridismo.

O fato é que o entendimento do sincretismo se torna realmente bastante complexo. É necessário decerto, um conhecimento prévio das religiões e elementos que o compõem.

Assim sendo, a teologia cristã, especificamente após o Concílio Ecumênico Vaticano II, convocado pelo Papa João XXIII, se abre ao diálogo.

Essa mudança de ótica tanto legitima e quanto estimula o reconhecimento da diferença. A condição fundamental para um diálogo inter-religioso.

Deste modo, o Concílio Ecumênico Vaticano II possibilita fazer relações em torno dos seguintes cortes epistemológicos:

fé e vida;
teologia e ciência;
igreja e sociedade;
igreja e civilização;
missão como anúncio e diálogo no mundo, na sociedade e na universidade;
religião, modernidade e pós-modernidade;
religião e sociedade;
religião e campo simbólico.

A reflexão teológica permite sobretudo, analisar de forma pontual a vinda de vários elementos da cultura africana ao Brasil.

Fenômeno iniciado no período do Brasil colonial, e ainda hoje com as diversas migrações.

Desta forma, para compreender o sincretismo entre o catolicismo e as religiões vinda da África, isto é, as religiões afro-brasileiras, assim chamada por muitos antropólogos e sociólogos da contemporaneidade, é necessário a compreensão de alguns acontecimentos do Brasil colonial, séc. XVI – XIX.

Haja vista, este período onde o Brasil e algumas partes da Europa viveu a triste experiência de regime escravocrata.

A religiosidade brasileira é composta por uma acentuada diversidade cultural, isto é, no modo de crer e compreender a fé no Brasil.

Contudo, sabe-se que, em outros países onde também houve a deportação de negros da África, há também a relação sincrética com o catolicismo. Um exemplo atual é a experiência religiosa vivida em Cuba, 4 em variadas regiões.

Os mesmo adeptos do catolicismo, são de forma sincrética os mesmo adeptos das religiões de matrizes africanas.

Tal como no Brasil, o tráfico de escravos africanos para Cuba começou já no início da colonização da ilha pelos espanhóis.

Neste período, o Brasil decerto, era um mercado ao mesmo tempo exigente e garantido.

Mesmo no início do século XVII os portugueses ainda forneciam escravos para a Espanha.

Há várias datas que marcaram o início do tráfico nas Antilhas. Contudo, a que é provada historicamente, segundo Arthur Ramos foi no ano de 1517.

Isso se deu quando o rei Carlos I, da Espanha, permitiu a entrada de escravos. Este período foi até o ano de 1880 na abolição da escravização.

No cenário do brasil colonial nascem as confrarias dos negros.

A igreja lucrou com os escravos, haja vista, a mentalidade de algumas pessoas, da época, em especial da igreja católica,.

Segundo a exposição de Bastide a igreja aceitava a escravidão.

A igreja, que defendera com tanta energia a causa dos ameríndios contra os colonos e mesmo contra o próprio governo da metrópole, por outro lado, aceitou a escravidão do negro.

Conquanto, ela mesma lucrou com isso:

Em primeiro lugar, a propriedade de Santa Cruz compreendia, em 1768, 1 205 escravos;
Em segundo lugar, o convento do Desterro na Bahia tinha 400 escravas para 74 freiras.

Desta forma, a mentalidade era que o negro estava entregando sua força física e seu trabalho, e o dono da fazenda estava lhe dando alma[…],

mas, se a igreja aceitava a escravidão do negro, aceitava-a somente sob certas condições: se lhe tomava o corpo, dava lhe em troca uma alma.

O senhor branco podia lucrar com a mão de obra servil. Contudo, esse direito estava contrabalançado por deveres correlatos, figurando, em primeiro lugar, o da cristianização. (BASTIDE, 1989. p.77.)

Ou seja, pelos sacramentos e pela catequese recebida de forma obrigatória, os donos das fazendas estavam preocupados com o lucro que seus escravos podiam lhe render, porém, a igreja exigia a cristianização destes negros e, desta forma, a cristianização de sua cultura.

Assim sendo, fundam-se as confrarias dos negros e mulatos, segundo Roger, sob os moldes das confrarias dos brancos

Sincretismo religioso como estratégia de sobrevivência

Para exemplificarmos o sentido prático do sincretismo religioso tanto como processo quanto ato comunicativo e tradutório que se utiliza de diferentes fatores extratextuais e intratextuais, recorremos parcialmente ao arcabouço teórico .

Por fim, trazemos exemplos de traduções de romances de Jorge Amado em alemão. Sobremaneira para mostrarmos a complexidade da tradução de termos religiosos afro-brasileiros.

No caso do Brasil, o sincretismo pode ser claramente observado. Não somente no aspecto do catolicismo, mas também de outras culturas religiosas.

Especialmente nas religiões de matriz africana assim como no Xamanismo.

O sincretismo no Brasil apresenta-se de forma bastante enraizada na cultura do povo brasileiro.

Por conseguinte, a Umbanda, religião nascida no país, é chamada de “tipicamente brasileira”.

Ela responde por se relacionar doutrinalmente não só com o Cristianismo, mas também com o Espiritismo Kardecista. Ademais, com o Candomblé africano e o Xamanismo indígena.

Outro exemplo forte de religião sincrética, o Santo Daime

Religião nascida na Floresta Amazônica. Entretanto, ela mescla a espiritualidade do Xamanismo indígena com crenças do Catolicismo e da Nova Era.

A identificação dos santos católicos com os orixás africanos foi a primeira instância do sincretismo religioso brasileiro.

Esta identificação se processou tanto no nível do imaginário quanto do arquétipo.

No caso do Brasil, o sincretismo surgiu da histórica imposição dos cultos católicos aos escravos africanos nas senzalas. Paulatinamente, alcançou uma dimensão mais plural e até política.

Um exemplo disso é a associação da deusa africana Oxum com a Virgem Maria, na devoção a Nossa Senhora da Conceição Aparecida.

Os escravos negros identificaram a imagem da santa de cor negra, encontrada por três pescadores nas águas do rio Paraíba do Sul em 1717 com Oxum, que é a orixá regente das águas doces, do amor e da maternidade.

Com a aceitação do culto a Senhora Aparecida e seu reconhecimento pela Igreja, que a declarou Padroeira do Brasil, a Umbanda de matriz africana sancionou o sincretismo com Oxum de tal modo que sua festa fosse associada à da santa católica, em 12 de outubro.

Casos semelhantes podem ser verificados, também, no sincretismo de Jesus Cristo com Oxalá, de São Jorge com Ogum, de São Sebastião com Oxossi, de Santa Bárbara com Iansã, de São Jerônimo com Xangô e de São Cosme e São Damião com os orixás Ibejis, dentre outros.

Nossa Senhora Aparecida

Conta-se que em 1850, um escravo chamado Zacarias passou em frente ao santuário de Nossa Senhora Aparecida.

Ele seguia escoltado por um feitor e com os pulsos atados por grossas correntes.

O escravo pediu permissão para rezar diante de Nossa Senhora Aparecida e, milagrosamente, as correntes caíram deixando-o livre.

Por conta da sua cor, Nossa Senhora Aparecida, costuma ser saudada como a “santa negra” ou “a santa morena”.

Esta devoção a Maria faz, todos os anos, com que milhões de pessoas se dirijam ao templo dedicado a ela, localizado em Aparecida, São Paulo, que é o maior centro mariano do mundo.

Esta face de Maria tão próxima do povo brasileiro foi bem destacada nas décadas de 70 e 80 quando a Igreja Católica da América Latina vivia os tempos da Teologia da Libertação.

A “opção preferencial pelos pobres”, que incluía dentre os muitos listados, negros e indígenas, da Conferência Episcopal (reunião dos bispos) em Puebla, México, em 1979, promoveu ações de aproximação maior da Igreja com os movimentos populares.

Fruto desta Igreja Católica mais renovada são organismos como a Pastoral Afro, que tem conquistado vitórias como o diálogo com as religiões afro-brasileiras, uma ação importante para o combate à intolerância religiosa.

Esta abertura católica começou com o Concílio Vaticano II, realizado de 1962 a 1965.

Os concílios são reuniões da alta cúpula católica para discutir e tomar decisões sobre diversos temas inclusive os que envolvem doutrina.

Um dos resultados deste concílio foi a realização das missas nas línguas nacionais e não mais em latim e com o sacerdote com as costas viradas para o povo, como acontecia anteriormente.

Pode-se dizer, portanto, que o sincretismo é importante a resistência da identidade de um povo na preservação de sua cultural e religiosa, que a cada dia se reinventa e se traduz na aproximação de elementos e valores bem diferenciados na sua natureza.

Um afro abraço.
Claudia Vitalino.
Pesquisadora-Historiadora – ativista do movimento negro
Fonte:ig/o globo



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Claudia vitalino

UNEGRO-União de Negras e Negros Pela Igualdade -Pesquisadora-historiadora CEVENB RJ- Comissão estadual da Verdade da Escravidão Negra do Estado do Rio de Janeiro Comissão Estadual Pequena Africa. Email: claudiamzvittalino@hotmail.com / vitalinoclaudia59@gmail.com

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