O Mito do Vampiro e seu Simbolismo III

O Mito do Vampiro e seu Simbolismo III

Para Jung, a libido deve ser o nome da energia que se manifesta do processo da vida e que é percebida subjetivamente, enquanto aspiração ou desejo.

Portanto, quando falamos em energia psíquica segundo Jung, podemos afirmar que ela não assume apenas a força sexual como coloca a psicanálise.

Mas manifesta-se em outras áreas, bem como no poder, na fome, no ódio, na religião, etc.

Outra analista junguiana, Gertrude Hess, ao falar sobre o conceito de energia desenvolvido por Jung, comenta que “Aqueles que querem atribuir visões originais do energetismo à superstição, apenas passam por cima de sua qualidade psíquica.

A ‘mana’ é tão real como o poder do amor ou as idéias que se apoderam de nós.

Mesmo um ocidental esclarecido pode sentir a emanação de uma pessoa querida ou de um objeto de sua preferência.

“Sente um calor não registrável por termômetro.
E seu entusiasmo ou enlevo não faz registrar qualquer potencial pelo voltímetro, embora seus efeitos possam ser objetivamente observados”. (Hess, 1994)

Numa relação onde estejam atuando complexos (vampiro-vítima) as pessoas falam nessa perda de energia não computada pela ciência, porém com efeitos perceptíveis para ambos.

De modo geral, aquele que “rouba”, sente certo poder.

A vítima, por sua vez, sente-se frágil e com a sensação de ter sido sugada, permanecendo “sem energia”, sem motivação.

O escritor Luís Pellegrine fala de energia vital oferecendo um amplo sentido a este conceito.

Falando em “vampiros de energia”, classifica os mesmos tendo o egocentrismo como principal característica.

Comenta também sobre o aspecto psicológico deste fenômeno:

“Na verdade, quase todos nós, em um momento ou outro de nossas vidas, quando nos encontramos em desequelíbrio neurótico, acabamos nos comportando como vampiros da energia vital alheia”.
(Pellegrine, 1996)

Pellegrine classificará em dez os tipos de vampiros:

Vampiro Cobrador = cobra sempre, principalmente aquilo que não lhe é devido. Acha que pode tudo, sem dar nada em troca.

Vampiro Crítico = critica a tudo e a todos negativamente. Seu lema é maldizer sempre, elogiar sinceramente nunca.

Vampiro Adulador = adula o ego da vítima, cobrindo-o de falsas lisonjas.

Vampiro Reclamador = cada fala ou gesto contém uma reclamação explícita ou implícita, sem se importar se há fundamentação ou não.

Vampiro Inquiridor = pergunta sobre tudo, como alguém que dispara uma metralhadora, e antes de se responder, interromperá, fazendo outra pergunta.

Ele não tem interesse nas respostas, quer apenas desestabilizar o fluxo da mente.

Vampiro Lamentoso = ataca pelo emocional e afetivo. Apresenta sua vida como um mar de lágrimas, gemidos e dor. Coloca-se como vítima diante de um mundo carrasco.

Vampiro Pegajoso = aproxima-se através da sensualidade e sexualidade da vítima.
Aproxima-se como se quisesse lambê-la com os olhos, mãos, língua, parecendo um polvo.

Vampiro Falante = o indivíduo permanece falando, falando, durante horas. Ele quer apenas um ouvido, obrigando a pessoa a escutá-lo.

Vampiro Hipocondríaco = cada dia aparece com uma doença nova, despertando nos outros cuidados e preocupações. Se for dado ouvidos, acaba-se doente, e ele muito bem.

Vampiro Encrenqueiro = tudo é resolvido a base de violência e agressão, tanto física quanto verbal, provocando na vítima um estado irado, raivoso, sugando-a assim em seu estado de cólera.

É possível observar nesta discussão o quanto é fácil estabelecer uma relação vampiro-vítima.

Pelegrine dá idéias de como a vítima pode livrar-se dessa situação, que só parece possível ser desfeita quando a vítima resolver suas questões internas e não se deixar levar pela sedução do vampirismo.

Da dependência ao crescimento psíquico:
Rompendo com a maldição “Só à medida em que o homem se expõe repetidas vezes à aniquilação, aquilo que é indestrutível pode surgir dentro dele”. (Kaufried Grafe Lou Durkein)

Segundo Chevalier e Gheerbrant, quando o homem assume sua responsabilidade perante sua vida, não há mais necessidade de projetar outros tantos conteúdos que ele mesmo pode estar resolvendo dentro de si mesmo.

Para esses autores, quando o homem aceita sua condição de ser um indivíduo mortal, o vampiro acaba por desaparecer de sua vida.

Continuam dizendo que “…só existirá (o vampiro) enquanto um problema de adaptação consigo mesmo ou com o meio social não estiver resolvido.”

O uso do alho, tão difundido em diversas culturas, é citado por Melton.

Este autor diz que o sentido era o mesmo de tomar ervas, onde havia a crença de que o sangue ficaria azedo.

Acreditava-se que dessa forma o vampiro manter-se-ia afastado.

Quando o vampiro é morto, a tradição manda que uma estaca seja enfiada em seu coração ou em seu estômago.

Sabe-se que o coração representa nosso centro vital, pois ao parar de bater, morremos.

Sede de nossos sentimentos, possui também uma conotação de ligação com o  divino para hindus e egípcios.

Portanto, a estaca no coração do vampiro parece ter a intenção de acabar com afetos nocivos, para que não reapareçam novamente.

O estômago também possui um simbolismo interessante, pois é a sede de nossa alimentação a ser digerida.

Talvez a estaca no estômago do vampiro signifique acabar com sua alimentação.

Sabemos que o alimento representa os afetos que engolimos.

Assim, mais uma vez, é feito um rompimento com o objetivo de acabar de vez com tudo de nocivo que esse vampiro pode ter-se alimentado.

Da mesma forma, cortar a cabeça do vampiro parece trazer a idéia de dar fim ao racional, nosso centro de idéias, e trazer, possivelmente, o emocional de volta.

Quando se tem um complexo negativo, supondo a energia do ego, muitas vezes isso se reflete em novas defesas através de atitudes racionais, usando muito da “cabeça”.

Ao entrarmos em contato com esse complexo, a emoção volta a fluir e o razão não é mais usada como defesa.

Ocorre, assim, uma integração entre consciente e inconsciente.

Aliás, o crucifixo como forma de proteção contra o vampiro, veio com o Igreja e demais cristãos.

Logo, é um símbolo novo.

A cruz representa o sagrado, mesmo antes de Cristo.

Ela contém em si a ligação entre o céu e a terra, tendo, dessa maneira, uma função de síntese.

Para os orientais, é a ponte para chegar em Deus.

A luz também é inimiga do vampiro.

Ele age à noite.

Tal como o morcego, fica cego à luz do dia em algumas versões do mito.

Assim, verificamos que quando trazemos um complexo negativo (podendo ser representado pelo impuro) para a consciência (podendo ser representada pela luz, claridade), ele perde a força da escuridão, saindo da sombra pessoal.

Para Jung, a sombra é uma parte de nossa personalidade por onde vão todos os conteúdos que negamos desenvolver na consciência.

Encarar nossos conteúdos inconscientes, trazendo-os para para a luz da consciência, é um ato de coragem.

Além de ser a forma mais eficaz de eliminar nosso vampiro interno.

Quando o vampiro interno (o complexo negativo) se dissolve, também e impossível estabelecer uma relação vampiro-vítima.

Entretanto, para que essa relação sobreviva, ambos devem ter complexos negativos atuando.

É importante lembrarmos que toda vítima traz um um vampiro em potencial enquanto oposto, e todo vampiro traz em si um pouco de vítima também.
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Referências Bibliográficas

CHEVALIER, J., GHEERBRANT, S. Dicionário de símbolos. São Paulo : José Olympio, 1990.
HALL, James A. A experiência junguiana. São Paulo : Cultrix, 1992.
HESS, Gertrud. O tratamento na psicologia analítica. V.Eschenbach, Vol.2/I, 1994.
HUMBERT, Elie. Jung. São Paulo : Summus, 1990.
JUNG, C.G. A natureza da psique. Petrópois : Vozes, 1984.
MELTON, Gordon J. O livro dos vampiros. São Paulo : Makron Books, 1995.
PELLEGRINE, Luís. O decálogo dos vampiros. Planeta. Ano 24, n.6, p. 44-50, 6 de junho de 1996.
FRANZ, M.-L. von. O caminho dos sonhos. São Paulo : Cultrix, 1988.



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