Crise dos 40? Parte II

Crise dos 40? Parte II

As Crises de Liberdade e Independência

As crises saturninas, crises estruturais que ocorrem aproximadamente a cada sete anos, além daquelas simbolizadas pelas relações que Saturno estabelece com pontos específicos de nosso horóscopo pessoal, estão relacionadas aos limites do nosso corpo, aos limites de nossa consciência.

Saturno representa inclusive, dentre outras coisas, a pele, como um limite do próprio corpo.

As crises de Saturno acontecem, em geral, em função da constatação de nossos próprios limites e da necessidade natural de superá-los.

Saturno é o último planeta na ordem planetária visível a olho nu.

De certa forma, o homem está limitado ao que ele pode perceber a olho nu, e podemos até dizer que as crises relativas ao trânsito desse planeta são crises de percepção, de reconhecimento dos limites do olhar.

Geralmente nós só conseguimos ir até onde conseguimos enxergar.

O que está além do alcance do olhar ou é transcendental, ou é mágico, e provavelmente eu me inclino a ignorar, porque é assustador, desconhecido, misterioso.

A crise referente a esse planeta provém principalmente de percebermos que existe algo além do que estamos acostumados a ver, e esse algo está nos chamando, chegou o momento de enfrentar o que está além do que achávamos ser normal em nossas vidas.

Saturno é o planeta que nos propõe um contato com a nossa própria transcendência, com a condição transpessoal de nossa existência, exatamente por apresentar cruamente nossos limites e fazer-nos perceber que existe algo além de nossas ilusões.

Quando começamos a nos libertar das limitações da nossa estrutura, percebemos que não éramos assim tão limitados, percebemos que nosso maior objetivo da vida não era alimentar e retroalimentar a eterna estrutura, e começamos a transcender, a ir além, a ingressar no plano transpessoal, que é o plano onde o símbolo acontece, se manifesta de fato.

É um lugar que parece de sonho, mas que é menos ilusório muitas vezes que a ilusória e limitante descrição que fazemos da realidade.

É o lugar onde pode ocorrer a cura e transformação, o perdão, o amor em sua dimensão maior.

No plano da mente pura e simples, a gente jamais consegue perdoar as mágoas e ressentimentos que carregamos, o nosso ego não permite isso; mas no plano além do ego, conseguimos e, podemos obter de fato, a cura das causas de nossos males, podemos conquistar a verdadeira liberdade, nos desligarmos dos vínculos e verdades que nos são impostos pela educação e pela cultura.

A escolha e a conseqüente decisão, “krino”, representam a liberdade.

Liberdade, nesse caso, é o que ocorre quando nos livramos dos limites impostos pela estrutura social e pela nossa própria estrutura. Sair disso não é negar o próprio corpo, isto seria burrice.

Significa assumir nosso corpo e reconhecer que temos possibilidades além dos seus limites, que cada limite pode ser vencido e superado, nós percebemos essa possibilidade quando abrimos mão, e quando reconhecemos que existe algo além disso.

Esse reconhecimento é referente a Urano, o primeiro planeta dos “invisíveis”, o planeta que vem logo depois de Saturno, e que é o que encontramos quando superamos nossos limites.

Urano simboliza a possibilidade da liberdade em nossos mapas.

O primeiro momento em que ele se manifesta com maior evidencia nos horóscopos de todas as pessoas é por volta dos 21 anos, e depois aos 42, isso porque seu ciclo é de 84 anos em média, e aos 21 ocorre a primeira quadratura de Urano consigo mesmo, e aos 42 sua primeira oposição.

Nos mapas individuais, Urano forma outros aspectos com os planetas, representando outros momentos da experiência uraniana em nossas vidas.

Urano, conforme vai transitando em nosso mapa, vai provocando algum tipo de angústia, desperta a consciência de que talvez exista alguma coisa errada em nossas vidas, faz sentir muitas vezes que estamos em algum tipo de prisão de grades invisíveis.

É muito comum também durante seus trânsitos a gente sentir que nasceu na época errada – eu devia ter nascido, dizemos às vezes, no séc. XVI , ou então lá pelo ano 2200 – a pessoa se sente deslocada, oprimida pelo que existe ao seu redor e então, começa a acreditar que pode existir algo além do que já conhece. Esse sentimento, essa descoberta chamamos de liberdade, desejo de liberdade.

Liberdade é a possibilidade de se desapegar da estrutura, não é viver sem estrutura, mas deixar de dar tanta importância a ela.

O compromisso com estrutura social e pessoal deixa de ser uma prioridade.

Ela existe para manter as relações, manter nosso trabalho, manter nossa vida, mas isso deixa de ser o mais importante.

O que passa a ser o mais importante?

Não tenho a menor idéia, isso é pessoal, está vinculado ao horóscopo de cada indivíduo, mas é fato, que descobrimos que nesse momento podemos deixar de lado o sentimento de opressão e cobrança que o mundo nos impõe o tempo todo.

A gente pode fazer o que quiser.

O limite para o que eu posso e quero fazer vai ser o respeito à liberdade e à identidade do “outro”.

É relativamente fácil perceber isso aos 42 anos e muito mais difícil aos 21, durante a primeira quadratura de Urano.

Aos 21 o indivíduo tem a oportunidade de se libertar da dependência familiar, o que nem sempre acontece.

Em alguns casos, os pais em nome do apego que chamam de amor, sustentam e aprisionam a seu critério os filhos até idade bem avançada; mas tecnicamente, biologicamente, em termos comportamentais, 21 anos é uma idade em que a pessoa já pode e deve aprender a cuidar da própria vida, buscar seu caminho no mundo, se desatrelar de uma estrutura familiar e se tornar autor do seu próprio destino. Por isso se diz que esse é o momento da “maioridade”.
Nesse momento, durante a primeira oposição de Urano, uma nova e intensa crise toma conta de nossas vidas.

A necessidade de tomar novas decisões é poderosa e inevitável.

É a crise dos 40, a crise do lobo ou da ovelha, depende do ponto de vista.

Durante essa passagem estabelecemos contato com a consciência, -queiramos ou não-, de sermos cidadãos do universo.

Podemos reconhecer nesse momento da existência que nosso compromisso com o universo e com a vida é maior do que o compromisso com o trabalho, ou com a carreira, ou com a imagem pessoal.

É bom deixar claro que estes compromissos com a realidade objetiva continuam sendo importantes, mas deixam de ser prioridade, deixam de ser a razão maior da vida no momento em que surge a consciência do nosso papel maior, nossa relação com o universo e, constatamos que estamos, todos os viventes, no mesmo barco e que somos cidadãos do mundo.

Alguns conceitos e comportamentos consagrados em nossa cultura, como por exemplo, o de que “aquele indivíduo lá” não tem nada a ver comigo, eu mal o conheço, ele nem é da minha turma, nem é parente, etc., deixam de fazer sentido.

Durante a oposição de Urano podemos perceber nossa conexão, nosso vínculo com o mais distante ser.

Constatamos que somos filhos do mesmo pai, criaturas do mesmo Criador.

Se “aquele indivíduo lá”, aparentemente desvinculado de minha vida ou de meu campo de interesses estiver sofrendo, estiver infeliz, por mais que eu esteja feliz, a minha felicidade é tola e superficial, porque eu vou ter que respirar o mesmo ar que ele, viver no mesmo planeta, compartilhar a mesma energia, a mesma luz.

Urano em seu movimento cíclico nos oferece a consciência de que podemos ir para além dos limites do nosso corpo, e a partir dessa consciência, constatamos a responsabilidade e o compromisso com o “outro”, com todos os espíritos que habitam esse plano.

Mas o que pode acontecer durante essa crise?

Nós estamos tantas vezes apegados a um modelo existencial, definido por um processo de vida de aproximadamente quatro décadas, e de repente a pessoa que lutou tanto para conseguir ser, por exemplo, gerente do departamento do almoxarifado, acumular alguns bens, constituir uma família como lhe foi ensinado, agora vai mudar sua vida, assim “sem mais nem menos”?

É muito sério isso, até mesmo dramático.

Tenho um amigo que começou trabalhando como ofice-boy num banco e chegou a ser diretor internacional do banco.

Ele começou de baixo, estudou e trabalhou muito, muitas vezes se humilhou, mas “chegou lá” com muito esforço.

Quando aconteceu o momento da crise uraniana, quando a consciência de que ele poderia ser mais do que sempre achou que era, a vida pediu uma transformação, uma nova percepção da realidade e ele afirmou:

“não, eu lutei tanto para ter tudo isso, não vou desistir agora, não vou mudar agora!”. O que lhe aconteceu ?

Pirou, segundo seus amigos e conhecidos.

Pediu a conta no banco, comprou um sítio e foi criar bode (isso mesmo, bode!).

Um investimento insólito – para o padrão que sempre seguiu e aparentemente estava dando certo.

Por que isso? Porque deixou a vida parti-lo ao meio?

Existem casos de indivíduos, por exemplo, que fogem com a empregada ou com o motorista, abandonando a família e uma vida aparentemente estruturada e até feliz, por que?

Talvez seja porque a vida está pedindo uma transformação radical em seus conceitos, em sua percepção e atuação diante da realidade, mas a pessoa resiste tenazmente, não aceita a idéia de abrir mão de absolutamente nada, e aí o que acontece?

A energia transformadora reprimida se transforma, e desperta aspectos sombrios de sua personalidade.

Antigos medos e recalques afloram, o indivíduo fica confuso, perde a noção de si mesmo, fica “desentendido”.

Existem os casos extremos, patológicos, no qual a resistência à transformação leva o indivíduo até a matar, ele enlouquece, adquire uma doença grave.

O medo de se transformar ou se libertar pode conduzir a extremos, quando não for conduzido com gentileza e cuidado para consigo mesmo.

A experiência de se libertar significa talvez simplesmente se desapegar; descobrir que nada, nem a própria pessoa, é tão importante quanto pensava, mas às vezes é tão forte e doloroso constatar que tudo aquilo que eu tenho não tem a menor importância diante da imensidão de possibilidades do universo, que a pessoa fala: “poxa, mas como é que eu vou dizer que a marca do meu carro não tem mais importância?

Como é que vão me aceitar se aquele meu relógio Rolex não vale mais como referencia de meu poder? Como repentinamente o meu cargo de diretor gerente pode não me fazer feliz de verdade?” Apenas compreendendo isso, apenas percebendo que felicidade e qualidade de vida não é rigidez, não é proveniente da estrutura externa, muito menos da importância dos objetos que possuímos ou do objeto que somos, é que vivenciaremos esse momento de crise com desenvoltura e leveza, saindo pessoas melhores e mais livres.

Em alguns casos, durante a crise referente a oposição de Urano, a pessoa começa a definhar, começa a “enrugar” por dentro.

Existem pessoas com menos de 50 anos que têm algo em si tão enrugado que parecem pessoas de 95.

Em outros casos, surge um adoecimento que, sob o ponto de vista da sociedade é considerado “normal nessa idade”, mas se pensarmos bem, se analisarmos culturas primitivas ou mais integradas aos ritmos da natureza, veremos que adoecer nessa idade nem é normal e muito menos necessário.




Outros artigos interessantes deste mesmo autor:

Deixe seu like e siga nossa Rede Social:
0

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *